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Balzaquiana aguerrida, razoavelmente satisfeita com as escolhas de agora.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Releitura étnica




"Só são ruins e perigosas as tristezas que carregamos em meio às pessoas para dominá-las; como doenças que são tratadas de modo superficial e leviano, elas apenas recuam e, após uma pequena pausa, irrompem ainda mais terríveis. Essas tristezas se acumulam no íntimo e constituem a vida, constituem uma vida não vivida, desenhada, perdida, de que se pode morrer.

Se nos fosse possível ver além do alcance do nosso saber, e ainda um pouco além da obra preparatória do nosso pressentimento, talvez suportássemos as nossas tristezas com mais confiança do que nossas alegrias. Pois elas são os instantes em que algo novo penetrou em nós, algo desconhecido; nossos sentimentos se calam em um acanhamento tímido, tudo em nós recua, surge uma quietude, e o novo, que ninguém conhece, é encontrado bem ali no meio, em silêncio".

(Rilke - Cartas a um jovem poeta)


Habita o novo neste meu silêncio interno. Conquistei-o à custa de uma certa confiança, meio trôpega, é verdade, ao suportar as tristezas. A que nos entrega a esse novo que Rilke tão bem apresenta ao jovem poeta Franz Xaver Kappus. E o novo é alegre, lúdico, quase infantil. Sem medo do vexame de desafinar na brincadeira de cantarolar lembranças num karaokê.

Em Angola, o novo é a releitura de mim. Em Luanda, meu sangue africano guerreia com o índio e o branco ancestrais, ressignifica minha identidade. E pára de brigar. Ontem, em meio ao incomensurável prazer de um petit gateau luandense, toquei neste ponto. E, como sempre, vou fazendo retoques neste rascunho. Menos étnica, aceito todos os eus. Sou de todas as cores.

O colorido étnico avizinha-se. Embora, à exceção desta viagem antropológica, não saiba precisar o que há no silêncio interno. Esta outra que renasce, enquanto esgotam-se os últimos tempos balzaquianos. Vou aos poucos preparando o terreno para este renascer, quase diário. Certamente me levará de volta aos pequeninos prazeres nossos de cada dia. Do tempo em que, em geral, somos felizes e sequer sabemos. Por que, agora sei, etnia não passa de um mero detalhe, homo sapiens ainda ignorantes a respeito da delicadeza da nossa condição.

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